Páginas

terça-feira, 27 de julho de 2010

Pico da Bandeira - via Minas Gerais

"Não subestime o Pico da Bandeira"



Pico da Bandeira -
Nível Médio / Difícil
Distância (trilha) : ~9km
Preço: R$16,00 + comida + gasolina



Dados:
Distâncias:
Portaria do Parque - Tronqueira : 6,44km (se faz de carro)
Tronqueira - Terreirão (passando pelo Vale) : 5,1km (trilha - a pé)
Terreirão - Pico da Bandeira - 3,9km (a pé)

Desníveis:
Tronqueira - Terreirão : 400m
Terreirão - Pico da Bandeira : 400m


Atrações:
Cachoeira Bonita
Vale Encantado (parte do leito do rio, com alguns pequenos laguinhos. Mais pra tirar fotos)
Pico da Bandeira (última e mais alta atração)

Pontos de descanso / para dormir:
Tronqueira (1o. camping) - dá pra ir de carro
Terreirão (2o. camping) - só a pé

O que não esquecer:
  • Roupa impermeável
  • Luvas impermeáveis
  • Barraca resistente a chuva
  • Cobertores pesados e/ou saco de dormir que suporte temperaturas negativas.
  • Comida (dentro do parque não há restaurantes nem lanchonetes)

Trilha:
Parte 1: Tronqueira - Terreirão
  • Nível Fácil
  • Desnível : 400 metros
  • Distância : 5,1km
  • Bem sinalizada: sim.
  • Risco de perder : não.
  • Atrações no caminho : Vale Encantado (leito do rio que forma a Cacheira Bonita)
  • Tempo: 2 a 3 horas (tranquilo)

Parte 2: Terreirão - Pico da Bandeira
  • Nível : medio / difícil
  • Desnível : 400 metros
  • Distância : 3,9km
  • Bem sinalizada : sim, mas de noite com prováveis nevoeiros, a sinalização pode ser inútil.
  • Risco de perder : sim.
  • Atrações no caminho : a vista. (se de dia)
  • Tempo : 2 a 3 horas (tranquilo)

Sugestão de Roteiro:
Entre no parque. Pague a entrada para dormir lá dentro. Siga de carro e faça uma parada na Cachoeira Bonita. De lá, siga para a Tronqueira (primeiro ponto de parada). Deixe o carro lá, prepare suas mochilas e suba em direção ao Terreirão. No caminho, se quiser, visite o Vale Encantado (pra tirar algumas fotos, apenas) e siga em direção ao Terreirão. A subida é tranquila.

Ao chegar ao Terreirão, escolha um local para montar a sua barraca. Como alternativa você pode ficar no Abrigo de Pedra (é de graça). Porém, como não tem como reservar a estadia nele, pode ser arriscado contar com ele (sem levar barracas). Outra bela opção é reservar o abrigo (sem ser o de pedra) que custa apenas R$10,00 (pode valer muito a pena, pois o peso que não se leva de barraca pode-se compensar com mais roupas de frio).

Banheiro:
Lá em cima há banheiros comunitários inclusive com duchas. Existem captadores solares, porém, nós não vimos eles funcionando. Mesmo com sol, a água saia do chuveiro gelada! (vimos apenas um louco TENTANDO tomar banho, mas sem sucesso).

Vá dormir cedo, no começo da noite, para acordar de madrugada, lá para as 2:30 da manhã. Levante, tome um rápido café e vá em direção ao Pico da Bandeira para ver o sol nascer. Leve as luvas,um pouco de comida e água! (se der, gps) Obs: Se chover, pode fazer muito frio.

Existem mulinhas que você pode alugar para levar a maior parte do seu peso (elas sobem apenas até o Terreirão).


Principais pontos do passeio:
Abrigo de Pedra: São apenas paredes, sem nenhum conforto dentro, sem reserva garantida (o primeiro que chegar, pega).
Abrigos no Terreirão: Por R$10,00 você pode dormir lá, poupando o peso das barracas até o Terreirão (ligue para o parque para reservar).
Vale Encantado : Parte visitável do leito do rio que desce o monte do pico. Fica entre a Tronqueira e o Terreirão. Bom para visita rápida, pra tirar algumas fotos.
Cachoeira Bonita : Única cachoeira de fácil acesso no Parque, do lado de Minas Gerais. Fica entre a portaria e a Tronqueira.
Terreirão : Camping de apoio, entre Tronqueira e Pico da Bandeira (onde ficam os abrigos).
Tronqueira : Camping do Parque. Se chega de carro.




Mapa:

Exibir mapa ampliado


Acordamos as 4 da manhã para um árduo sábado de trabalho. As 4:30 em ponto (isso é raro) saímos em direção a Alto do Caparaó, a 330km de Belo Horizonte, aproximadamente.

Fomos pela BR 381, passando por Manhuaçu, Realeza, Manhumirim e finalmente.. Alto do Caparaó. De lá, seguimos para o Parque Nacional Do Caparaó, bem perto da cidade. Antes de chegar lá você sobe bastante (ingreme) mas com estrada asfaltada e em boas condições.

Demoramos um bocado pra chegar até lá, devido a estrada ruim das BRs, com muitos buracos e um bocado de trânsito devido a acidentes (feios!), dirija com cuidado.

Ao chegar ao parque, perguntamos informações básicas e confirmamos nossa reserva no Terreirão: nossa primeira parada do dia.


Entrada do parque Nacional de Caparaó
From Pico da Bandeira

O dia de sábado era tranquilo, apenas a preparação para o cume, o pico, no sentido literal da palavra (também).

O nosso plano era chegar tranquilo ao Terreirão pra depois subir ao Pico da Bandeira.


Faz-se o trecho Entrada do Parque - Tronqueirão de carro, numa boa, estrada asfaltada. Antes de chegar la no Tronqueirão (onde o carro fica) passamos para visitar a Cachoeira Bonita - única cachoeira do parque do lado de Minas Gerais (as outras se encontram do lado do Espírito Santo).


Vista da Cachoeira Bonita, antes de chegar a seu pé
From Pico da Bandeira

A Cachoeira é realmente... bonita :), bem alta, numa queda preguiçosa pelas pedras a uns 70graus de ângulo de queda. Nessa época, pouca água cai, mas de forma incrivelmente gelada. Já nesse ponto (a cachoeira fica um pouco abaixo do Tronqueirão) a temperatura já é fria (nadar foi, infelizmente, impossível!)


Deltalhe do poço pequeno com um pedaço fundo, a esquerda
From Pico da Bandeira


Ficha
Nome: Bonita
Altura: ~70 metros
Tipo: Sem queda direta, arrasta-se pelas pedras inclinadas.
Tamanho do poço (C x L x P) : pequeno, não é pra nadar, mas dá pra mergulhar um pouco.
dá pra subir em seu topo? : Provavelmente sim, mas não o fizemos.
tem área pra ficar deitado? Sim. Mas é uma cachoeira pra se visitar rapidamente, por não ter um poço tão convidativo.

Parte do Poço mais funda
From Pico da Bandeira


Queda da Cachoeira
From Pico da Bandeira


Notas (0 a 5):
Nadabilidade no poço: 2 (poço bonitinho, mas pequeno).
Pulabilidade no poço: 1 (não da pra pular)
Ficabilidade debaixo da queda: 2 (por ser uma queda rasteira, não dá pra ficar muito debaixo dela)
Beleza da cachoeira: 3 (ela é realmente bonita)



Havia pouca gente na cachoeira, tiramos algumas fotos, molhamos a mão na água, como se tivessemos esperança de nadar e continuamos de carro até o Tronqueirão.

Poço e fim da queda, visto da direita
From Pico da Bandeira
Mais alguns minutos e paramos o carro no estacionamento. Tiramos nossas mochilas e mochilões e nos preparamos para a primeira parte da jornada : Trecho Tronqueirão - Terreirão.


Tronqueira : Início da trilha para subir ao Terreirão
From Pico da Bandeira



É uma trilha tranquila e bem demarcada, quase sempre em subida. Fizemos esse trecho com relativa facilidade. Nenhum obstáculo, apenas um pouco de cansaço nesses 5,1km iniciais até a chegada ao segundo acampamento : Terreirão.


Esse é o Vale Encantado, fica beem no comecinho da trilha para o Terreirão.
Bem tranquilo de se chegar. Obranco na foto são nuvens, devido a altura.
From Pico da Bandeira


Poços do Vale Encantado. São poços pequenos, não muito pra nadar, mas pra tirar fotos.
From Pico da Bandeira


Aspecto geral da primeira parte da trilha (até o Terreirão) : bem tranquila e o leito do rio acompanha sempre a esquerda. (em alguns pontos da trilha ele é bem visível)
From Pico da Bandeira



Parte direita do Terreirão (pra quem está olhando para o pico).
Atenção, em julho costuma encher bastante.
From Pico da Bandeira


Esse é o abrigo que pode ser reservado para estadia, no Terreirão.
Não chegamos a ver o seu interior, mas tem as camas e fogão.
From Pico da Bandeira


Banheiros públicos no Terreirão. Há torneiras também.
From Pico da Bandeira


Abrigo de Pedra - uma opção de estadia no Terreirão,
mas, sem garantias de que já não vai estar ocupado.


From Pico da Bandeira



Início da caminhada as 2:30 da manhã
From Pico da Bandeira


A chegada ao Terreirão foi legal : apesar de que o camping estava cheio. O Camping é bem grande, então, ainda assim, conseguimos ajeitar um lugar legal pra gente. Reconhecemos cada canto, verificamos onde era a direção para o pico e nos preparamos para enfrentar a noite.

As 17 a despedida do sol sinalizou que o frio não estaria pra brincadeira - como era de se esperar. Eu sabia que um dos maiores obstáculos (e talvez o único) seria o frio.

Eu subestimei o Pico da Bandeira, essa é a verdade. Eu não me preparei muito, achei que não precisava, que era só andar e chegar. A grosso modo até é, mas nos detalhes....


O Rick, nosso amigo, havia chegado mais cedo ao Terreirão (nós ficamos pra trás) e ele acabou ficando instalado um pouco longe da gente.

Quando o sol se foi por completo o céu começou a mostrar pra que vinha - pelo menos era o que parecia - céu estrelado e único, como se vê em lugares não urbanos. A lua era crescente, talvez ajudasse um pouco na subida, logo mais por vir. As 19h (já tarde pra gente) começamos a jantar - miojos e cup nuddles na veia, com direito a um bolinho de chocolate cedido pelo nosso amigo Rick (eles foram convidados de honra no nosso canto).

Depois de uma discussão acalentada sobre crenças, deuses e verdades absolutas, decidimos ir dormir , pouco mais de 20h, não sem antes escutar uma vuvuzela tocar ao longe - sim, alguém lembrou de levá-la!)


A noite-tarde passou rápido pra quem precisava descansar bastante. As 2:00 em ponto o nosso despertador castigou. Era hora. E era claro que a gente não queria levantar. Com aquele frio pontecial! quem queria? Mas trabalhos são trabalhos. O F2 já gritava o meu nome da barraca ao lado. Não tinha problema gritar, porque a maioria das pessoas já parecia estar acordada, de fato, já as 2 da manhã, muita gente já estava subindo em direção ao pico.

Quando abri a barraca o frio já me acolheu de forma espantosa. Não é que estivesse menos 40 graus negativos, mas estava muito muito frio. Nessa hora eu olhei pro céu e me lembrei da cena do Titanic afundando, e fiquei imaginando quão aterrorizante pode ter sido praqueles que afundaram, tentar sobreviver com aquele frio, MERGULHADOS em águas do oceano.

Agradecendo por minha situação ser diferente, acabou que o frio ficou um pouco menos frio. Comecei a acelerar o pessoal, porque não podiamos sair muito tarde.Olhei em direção ao pico e era visível uma grande (grande mesmo!) fila indiana de luzes de lanterna subindo o pico (muita gente estava ja subindo). As 2 e meia, depois de um rapido café da manhã fomos nós. Preparados, morrendo de frio.

O início da trilha foi bem legal. A sensação de estarmos todos, umas 100 pessoa unidas, com um único objetivo é bem interessante. Estava bem escuro, parece que a lua não estava ajudando muito. Tínhamos apenas 3 lanternas pra 6 pessoas. Mas com tanta gente indo, era só ir seguindo o povo.

Começamos tranquilos e numa boa. Depois de 5 minutos andando as mãos já estavam um pouco mais quentes. Mas a precaução é quem salva, e ela estava guardada na mochila em minhas costas, composta por 2 cobertores e comida (nescau 300ml e barrinhas de cereal). A subida começa um pouco pesadinha, mas numa trilha tranquila. Porém, mais ou menos a 700m de distância do Terreirão, um dos meus amigos começou a sentir falta de ar. Falei para ele parar e esperar um pouco. Tomar uma água. Podia ser falta de comida, pis ele não havia tomado café da manhã. Seguimos subindo mas pouco depois o Liu sentiu falta de ar novamente. Enquanto isso pencas de gente passavam por nós, subindo a uma velocidade mediana. Ninguém queria perder o nascer do sol! Isso acabou causando uma sensação de que estávamos atrasados. Assim, começamos a ficar um pouco preocupados. Tinhamos que ir todos juntos, no mesmo passo, mas ao mesmo tempo não poderiamos atrasar.

O Liu se queixava de tontura, e isso ainda faltava muito para chegar ao pico. Ele ameaçou descer sozinho enquanto nós íamos para o pico. Era óbvio que não podiamos deixar alguém descer sozinho, por mais que a trilha estivesse relativamente tranquila apesar do escuro.

O resto da galera começou a pressionar, dizendo que deveriamos ir. Eu disse que precisavamos esperar. Seria arriscado apertar o passo com o Liu sentindo tonturas. Nesse momento instaurou-se aquela situação, muito comum em momentos críticos de trilha, onde ninguém sabe muito bem como agir. Esse silêncio evidencia que alguém ali deveria, tinha que ceder. Resolvi forçar um pouco e pedi pro Liu tentar mais um pouco, caso contrário, ele teria que descer!

Mas ele não podia descer só....! Como o resto da galera estava em casais, seria minha obrigação voltar com o Liu para o Terreirão. Eu estava injuriado por cogitar perder essa batalha. Mas também não podia deixar meu amigo na mão! E fazê-lo correr risco de vida. Eram 3:30 da manhã e estávamos a 900m do Terreirão , o silêncio continuava instalado no nosso grupo, o que provava preocupação que reinava. Calculei que se eu descesse não teria mais chances de conseguir chegar ao pico antes do sol nascer.

Foi aí que tomei a decisão mais difícil da noite: falei com o resto dos caras para subirem enquanto eu descia numa boa com o Liu, para que ele descansasse e se alimentasse direito. Eu estava com pressa, tinha pressa, pois apesar de tudo tinha esperanças de ainda ir ao pico. Foi bem difícil, psicologicamente falando, descer aqueles 900 metros totalmente contra a maré. Muita gente passava pela gente e não acreditava que estivessemos descendo - no sentido "errado"! muitos perguntavam porque, muitos falavam, "vamos subir! Não desistam agora!" etc. Se eu estava chateado, fico imaginando como estaria se sentindo o Liu.

Mas ok, antes não chegar ao pico, do que arriscar a vida como num Titanic afundando. A descida foi penosa e pareceu muito maior do que a subida. Deixei o Liu e nesse momento, já quase as 4 da manhã, já não havia mais ninguém iniciando o caminho de subida. Todos já tinham começado a pelo menos meia hora. Eu presumi que, ainda tinha chances de chegar lá em cima junto com o pessoal se eu desse um super gás nos primeiros 2km da trilha. Esse era meu plano B! E foi daí que tomei uma segunda decisão difícil - a precaução que eu tinha guardado nas costas ia ter que ficar pra outra vez. Abri mão dos cobertores e de todo peso - teoricamente regálico - e fui apenas com minha mochilinha de ataque - só a comida!

Saí correndo em disparada, o meu único objetivo naquele momento era alcançar o último grupo de pessoas que estava subindo. Foi cansativo refazer os primeiros 900 metros iniciais correndo, mas visto que consegui correr bem, minha moral subiu bastante!

Com apenas a minha lanterna a manivela subi num ritmo muito forte (correndo mesmo). Em pouco tempo eu consegui alcançar ver as lanternas lá em cima. Era o último grupo. Eu tinha em mãos o gps, mas só pra termos históricos de trace a demarcar, porque eu, subestimado que tinha o pico, nem a trilha tinha marcado direito no gps. (nem acompanhei).

Em pouco tempo alcancei o último grupo a ter saido do Terreirão, fiquei automaticamente conhecido como "o cara da lanterna manual". É que minha lanterna faz um barulho pra recarregar e naquela subida acabei sendo conhecido por isso "Onde está o cara da lanterna manual?!" diziam (a audição é o melhor sentido primário na subida para o pico).

Eu nem tinha percebido como o tempo tinha mudado. Aquele céu estrelado do dia anterior já tinha batido as botas. Só depois de respirar, olhei pro céu, e ele não estava nada agradável. De fato, nessa hora comecei a sentir um pouco minhas mãos. Não estávamos nem na metade ainda.

Continuei acompanhando o grupo numa boa, com boas esperanças de que chegariamos lá antes do sol nascer (era o objetivo de todo mundo!) Eu, como intruso do grupo, me limitei a apenas seguir os outros e a ajudar quando possível a iluminar melhor. Tudo estava correndo bem, quando de repente um nevoeiro, DO NADA, se instaurou no nosso caminho. A princípio aquilo não era problema porque a trilha era intuitiva. As pedras e matos nas laterais nos guiavam para o sentido correto. O problema é que mais ou menos no meio da trilha, essas laterais desaparecem. É o momento da trilha onde se abre uma clareira de pedras no meio da trilha e abre-se um leque de opções (qualquer sentido pode ser tomado, e apenas um deles é o certo!)

Sem enxergar um palmo a nossa frente, ficou difícil! A trilha é muito bem demarcada, mas é bem demarcada pra quando não há nevoeiros! E agora?? Era muito fácil errar ali.


Nesse momento começou a instaurar-se a dúvida entre os membros. Naquele momento todo mundo ficava meio travado sem saber o que fazer. Foi muito divertido perceber que grupos de trilha sempre reagem da mesma forma nesse tipo de situação. Instaura-se a tensão, seguido de um silêncio, dúvida, e depois de um tempo alguém decide chutar alguma coisa. Foi exatamente como foi.

O Nevoeiro começou a ficar muito fechado, sendo que era muito difícil ver a frente. Chegou um momento que conseguiamos ver uns 50cm a nossa frente só! Não dava pra ver nada! Nada mesmo!

As indicações amarelas que aparecem em todo o percurso não valiam de nada nesse momento. Nesse momento eu calculei que a chance de errar o alvo era alta...





Jabulaaaaani
Foi quando uma vuvuzela tocou. Alguém esperava por isso? Não! Em algum grupo mais distante, que ia em direção ao pico, alguém tocou uma .... vuvuzela! O louco que tocava a vuvuzela no sábado inteiro de noite, tinha resolvido levar a maldita. E quem esperava que nó fossemos agradecer a bendita? Ela nos mostrou o caminho! Foi totalmente por acaso que o dono da vuvuzela a tocou, pois ele não nos via!

Enquanto nós íamos para a direita uma vuvuzela nos veio da diagonal acima e esquerda. ora bolas, se alguém está tocando essa coisa lá, é porque é pra lá! Seguimos o som da vuvuzela e acabamos reencontrando a trilha, seguindo nosso caminho.

Tudo de repente tinha voltado a normalidade. Novamente as esperanças foram renovadas, como se tivessemos ganhado uma lufada de ar em pulmões que se afogavam. O silencio sumiu e a tensão diminuiu. Tudo foi tranquilo por uns próximos 30 minutos até que algo estranho aconteceu:

Um grupo de 7 pessoas estava indo no sentido "errado". Descendo! Todos perguntaram imediatamente a razão e a resposta foi incisiva e com raiva:

"Frio! Muito frio! Não dá pra aguentar!"

Confesso que naquela altura do campeonato isso me chocou um pouco. Mas presumi que era um pouco de frescura daquele grupo, afinal, estava frio, mas eu não estava sentindo frio suficiente pra desistir de continuar subindo! Já eram 4:30 e segundo informações ainda faltava um bocado pra chegar até o pico. "Que povo fresco!" pensei comigo mesmo, "descer agora??"

Porém, o grupo que eu estava seguindo, frente ao fato de um grupo ter descido alegando *muito* frio, decidiu, se aguentar por ali, isto é, enrolar o máximo possível naquele ponto, mais baixo (e portanto menos frio) pra não correr o risco de o frio apertar demais.

Eu comecei a ficar ansioso e o que queria mesmo era convencer o resto das pessoas do grupo a continuar subindo, pois ainda faltava muito! E se não chegássemos a tempo? Porém, eu era um intruso ali, e não seria nada simpático semear a discórdia, dar essa opinião naquele momento. É.... eu estava só! Nesse momento eu resolvi assumir os riscos. Me descolei do grupo e voltei a subir sozinho, agora apenas com a cia do nevoeiro, torcendo para que não houvesse mais clareiras perditivas.

A sorte esteve comigo nesse pedaço e continuei subindo tranquilo, com o frio ainda suportável. Mas de repente, eu comecei a considerar que aquele primeiro grupo que tinha descido não estava exagerando tanto assim....



A Mãe Natureza Não Perdoa
2 grupos, 3 grupos, 4... 5 , de repente muitas pessoas estavam descendo ao mesmo tempo! Um casal, um grupo de amigos, uma família, pessoas solitárias. Todos!
Pra todos perguntávamos o que havia, e a reposta não era diferente: "o frio estava insuportável!" Olhando para o céu, de fato, não sobrava mais nenhum vestígio de estrelas, eram só nuvens e.... água.

Sim, vinha a chuva. Era o que faltava, certo? Nesse instante eu me perguntava como estariam os meus 4 amigos que já estavam a frente. E resolvi parar quando comecei a me molhar. Foi daí que comecei a sentir na pele que a sensação de frio não era frescura nem psicológica. Fato é que qualqur psicologia ia pro espaço frente àquele frio que apertava. Estava de fato, GELADO. Já estávamos tão altos que de lá você não sente as gotas de chuva caindo, porque você está literalmente tocando as nuvens. A água se condensa ali mesmo. É engraçado.. é como se fosse uma sauna ao contrário.

De repente, muita gente começou a descer. Novamente eu me lembrei do filme o Titanic. Me senti como naquela cena onde o barco está dando o seu movimento final pra afundar de vez. Muitas pessoas pulando do barco, mas alguns resistiam bravamente.

Eu fiquei parado em uma pedra e comecei a agitar as minhas mãos que começavam a ser castigadas, sem luva, e agora molhadas. Em frente a mim havia um casal que também aderia a tática de esperar um tempo antes de subir até o pico (lá em cima devia estar um frio muuuuito frio). Estávamos num ponto pelo menos protegidos do vento, o que facilitava um pouco as coisas.

Eram apenas 4:50 da manhã! De acordo com informações deveriam faltar ainda uns 40 minutos de subida. Eu calculei que era melhor esperar um pouco e começar a subir de volta la pelas 5:40 (o sol sairia as 6:20). Enquanto isso muitas pessoas desciam! Eu nem pensei na possibilidade de os meus amigos estarem descendo, então continuei por lá.

A chuva não ficou forte porque estávamos alto. Mas o frio ficou muito forte. Eu agitava muito as minhas mãos, o que parecia não adiantar de nada. Enquanto isso eu iluminava com a lanterna ajudando todos aqueles que estavam desistindo e descendo. Eram muitos! Sem exageros, acho que cerca de 50 pessoas chegaram a desistir e descer antes do nascer do sol.

O que tinha a fazer era ajudar a iluminar. Iluminava um, iluminava outro, e depois mais outro. Em um momento um dos que descia disse:

"Fabrício, tudo bem?"

Um ledzinho no meu cérebro piscou ("peraí....Fabrício?!?!??")
Eram meus amigos!

"Fabricio! Cadu! Pessoal!"
"Diego??? Você veio??"

Eram eles descendo e quase passaram despercebidos! Também, com um nevoeiro daqueles, chuva, descida, tanta gente e sofrendo com aquele frio, isso não era muito impossível!

Nos cumprimentamos felizes, como amigos que não se encontram a tanto tempo, como amigos que se encontram por acaso no mesmo barco, e afundando feio!!! Falei com eles que não poderiamos desistir naquele ponto! Faltavam apenas cerca de 500 metros até o pico! Como iríamos desistir?

Com a minha moral alta (também... depois de tudo que eu tinha passado, o que viesse era lucro) eu acabei contaminando aos 4, das boas : Vamos subir, siiim! Pode não haver sol, mas fincar a bandeira nós fincaremos!


Como eu estava la disposto a subir, eles também iriam fazê-lo, e assim era!

Combinamos esperar naquele ponto até umas 5:40, o que seria o auge do frio. Com o passar do tempo, e como estávamos parados, o frio começou a apertar demais. Eu não sei como foi que o tempo passou ali. Foi desgastante esperar sem ter como nos aquecermos. Conversavamos qualquer coisa, tudo em prol do Pico, visando esquecer o sofrimento físico.

A maioria das pessoas havia desistido, inclusive alguns guias, mas nós estávamos lá, e íamos subir!

As 5:45 estávamos com muito frio. Quando eu olhei pras minhas mãos, fiquei pela primeira vez preocupado. Eu nunca tinha visto elas tão congeladas! e inchadas de frio! =S

Eu comecei a esfregá-las numa tentativa vã de esquenta-las um pouco. Mas depois de uns 70 segundos esfregando com muita força, elas esquentavam tipo, 0,5%. Ou seja, meus ombros não tinham força o suficiente pra esquentá-las!

Situação terrível!

Hora H
Começamos a subir assustados. Não estávamos muito confortáveis com a situação. O frio era de matar... mesmo!
Andar era a melhor coisa naquele momento. Pelo menos os pés iriam ser esquentados!

As 5:50 o sol começou a bocejar, não estava claro, mas estava um azul um pouco menos escuro...


From Pico da Bandeira



A cena do final do Titanic, a cauda dele afundando foram os nosso últimos 300 metros de subida, tensos, cada um por si. Nós nem vimos se estavamos todos em linha. Tinha ainda bastante gente subindo. E muita gente ainda descendo também!!

Nos últimos 100 metros já estava parcialmente claro mas não parecia que o sol ia aparecer de verdade. Era o auge do frio.



Chegada no pico:
From Pico da Bandeira

A sensação de chegar lá é especial. Mesmo bem desconfortáveis com o frio de matar, estávamos lá! Valia o nosso esforço todo! Foi bacana demais ver tanta gente lá em cima (sim, apesar de tanta gente descendo, muita gente aguentou), e todo mundo se cumprimentando dizendo "valeu valeu valeeeu"!

Lá em cima é o deserto. O deserto do frio. Chegamos eu e Rick e torcemos pra que os outros chegassem rápido pra tirarmos uma foto, provar que estivemos ali e cascar fora!

Sim, é terrível chegar ao destino e só poder ficar alguns minutos. Ninguém aguentaria muito tempo ali!

O Pico da Bandeira naquelas condições é o paradoxo. Ao mesmo tempo lindo e aterrador. As pessoas rindo e urrando de frio ao mesmo tempo. Todos se cumprimentando e tirando fotos tremidas. Pelo caminho muitas garrafas no chão (os infratores estão desculpados devido ao grande frio que impossibilita raciocinar em prol da natureza). Vimos tênis arrebentados, cobertores e blusas de frio abandonadas (aquelas não impermeáveis). Provavelmente desistentes que tiveram suas roupas não-impermeáveis inutilizadas.

Lá em cima não vimos nada. Era um branco total:

From Pico da Bandeira


"Rápido! Tira essa foto!" O frio era tanto que nem os músculos da bochecha respondiam para sorrir para a foto. É sério! O frio era espetacular e medonho!

Alcançamos o local final, mas não nosso objetivo: chegamos ao Pico mas sem ver nem um pedacinho do sol sequer. Infelizmente, dependemos também da boa vontade da natureza pra que faça um tempo bom, e não foi dessa vez que ela teve essa vontade (ouvimos relatos de que é muito mais tranquilo fazer o passeio sem chuva! E deve ser mesmo!)


Tiramos algumas fotos bem rápido (minhas mãos tremiam muito) e descemos o quanto antes.

A descida foi penosa, com chuva e com as mãos congeladas. Na volta fiquei bem preocupado com o estado das minhas mãos. Elas estavam beeem inchadas. Nessa hora eu só queria mesmo era chegar na minha barraca. Ainda tivemos força de descer discutindo religiões e deus, papos inacabados da noite anterior! :) O papo terminou em Budismo, legal!

Eu não via a hora de chegar lá embaixo depois de toda essa jornada. Ao chegar no camping, mais uma surpresinha: havia chovido dentro da barraca! (mais um despreparo, ter ido com uma barraca que não aguentava chuva). Mas eu não tinha tempo pra pensar. Me encolhi em forma fetal e me joguei debaixo das cobertas que me esperavam.. As minhas mãos estavam quase gangrenando! Demoraram uns 40 minutos pra voltar a temperatura normal. (Tenso...!)

O sol só saiu mesmo as 10 da manhã! Foi quando o tempo melhorou um pouquinho... Só aí deu pra sair da barraca já sem hipotermia, e descermos de volta para o carro. Tudo tinha molhado, cobertor, saco de dormir, meias reserva, toalhas etc. Não pretendiamos usar as mulinhas, mas visto o nosso estado e que havia muito peso devido as coisas molhadas, alugamos uma mulinha por R$50,00 pra carregar nossas coisas, e descemos tranquilos em direção ao carro.. vivos, e com uma grande vitória no nosso currículo:



O Poderoso Pico da Bandeira!


From Pico da Bandeira





Dicas - resumo:
-Não economize em roupas de frio.
-Leve luvas de couro! (muito importante!!) (luvas de pano não são resistentes ao vento e muito menos a chuva.)
-Leve roupas impermeáveis - calça e blusa (muito importante!!)
-O GPS pode ser imprescindível, principalmente se houver nevoeiro (comum nas madrugadantre o Tronqueira e o Terreirão pode-se usar mulinhas pra carregar o peso. (R$50,00).
-Se for de madrugada não se esqueça das lanternas.
-Se forem 3 pessoas, leve 3 lanternas, se forem 7 pessoas, leve 7 lanternas.


Download de Mapas:
Versão .gpx (para GPS's)
Versão .kml (para Google Earth)

sexta-feira, 16 de julho de 2010

Pico da Bandeira

Neste sábado.... Pico da Bandeira feelings.
Se não morrermos congelados, postaremos aqui breve!


update: estamos vivos (quase morremos) mas vivos. E com dois (super) posts acumulados. Espera aí!!!

Os Caçadores de Cachoeiras

Os Caçadores de Cachoeiras